ESCOLA DE SURDOS: LÓCUS DA CULTURA SURDA.
O espaço escolar caracteriza-se por planejamentos, estruturações curriculares, estratégias de atuação e outras discursividades. Estas constituem os sujeitos que ali se fazem presentes. Ao longo do processo histórico, a educação de surdos esteve permeada por um viés clínico-terapêutico em que a centralidade do trabalho desenvolvido estava organizada nas estratégias de “normalização” desses sujeitos. Entremeio a essa produção discursiva, a constituição da identidade surda foi permanentemente representada pela incapacidade e pela falta de audição, especificamente, a deficiência. No entanto, vivenciamos uma temporalidade em que é possível interpretar e reinterpretar a participação desses sujeitos no cenário da educação de Surdos.
Na articulação das pesquisas desenvolvidas pelos Estudos Surdos e pelos Estudos Culturais em Educação, torna-se possível compreender que as produções dos documentos oficiais, das políticas públicas e as propostas inclusivas para os sujeitos surdos estão ainda fortemente arraigadas nas prerrogativas desenvolvidas pelos ouvintes. As representações culturais desencadeadas nas diversas relações sociais, ainda esbarram numa narrativa em que esses sujeitos são vistos como intelectualmente inferiores, sem uma língua própria – composta por gestos aleatórios – sujeitos sem cultura. Essa produção vem sendo reinterpretada pela estruturação curricular da escola de surdos em que as discursividades inerentes à cultura se tornam artefatos constituintes das identidades surdas.
É no espaço da educação de surdos que os sujeitos constituem sua identidade. O currículo, na educação de surdos, não pode ser interpretado como um elemento neutro de transmissão do conhecimento. Ao contrário, ele é um campo privilegiado de relações culturais. Sendo assim, os discursos que marcam a educação de surdos utilizam-se de elementos da cultura surda: a Língua de Sinais, as Associações, a comunidade, dentre outros.
A contemporaneidade é compreendida como um espaço histórico em que as identidades são múltiplas. O sujeito dessa sociedade Pós-Moderna não estabelece uma identidade única, fixa e estável, ela é moldada a partir dos diferentes momentos e lugares em que ele se situa. Nesse sentido, a identidade deve ser compreendida dentro do campo cultural, a partir das produções dos discursos culturais. A identidade surda, nesse contexto, é o conjunto das características pelas quais os surdos se definem como grupo cultural, quais sejam: a língua, o currículo, a educação, a contextualização histórica das lutas, a referência aos modelos surdos.
Considerando que as identidades surdas são identidades politicamente estabelecidas, o espaço da Escola PARA/ DE/ COM Surdos é o lócus em que a diferença se estabelece, na mesma medida em que se configura num momento de acentuação de possibilidades políticas, de interconexões e desencadeamento de lutas em detrimento do respeito à língua e à cultura surda.
Torna-se pertinente frisar que é essencial tramar problematizações e discussões por uma educação para a diferença dentro do contexto da diferença. Esta, por sua vez, pode ser compreendida como inominável a partir do momento em que se toma a identidade surda também como inominável por suas inúmeras particularidades e especificidades. Sendo assim, a Escola de Surdos é um território de significativas produções culturais, ela necessita ser compreendida como o espaço privilegiado para a demarcação de práticas culturais específicas entremeio às produções curriculares que se concretizam nas afirmações da cultura surda.